Segundo Renato Meireles, CEO do Instituto Locomotiva, que pesquisa os hábitos da classe média, o consumidor de baixa renda classifica as bets como investimento e não como despesa ou entretenimento.
Insônia com as dívidas, tremores dos cobradores, dificuldade de enxergar perspectivas, fraqueza em voltar a jogar, delírios em acreditar que pode ganhar e depressão com o enorme prejuízo. Esses são apenas alguns dos sintomas que vêm assolando a vida de milhares de brasileiros.
— Apostas online e a dependência.
Você ficará viciado apenas com a possibilidade de ganhar. Veja como isso ocorre. O Dr. Timothy Fong, do Jane and Terry Semel Institute for Neuroscience and Human Behavior da UCLA, destacou que o vício em jogos online está relacionado ao sistema de recompensa do cérebro, que é acionado pela liberação de dopamina. No entanto, ele também ressalta que, ao contrário de outros vícios, o jogo é frequentemente associado a distorções cognitivas, como a crença de que continuar jogando eventualmente levará à vitória.
No caso das apostas online, a incerteza e a possibilidade de ganhar disparam altos níveis de dopamina. Mesmo pequenas vitórias ou o simples ato de apostar ativam esse sistema.
A dopamina não é liberada apenas quando você ganha, mas também na antecipação do ganho, alimentando a excitação e a expectativa. Essa descarga repetida faz o cérebro buscar novamente essa sensação, criando um ciclo vicioso. Percebe que você não se vicia em ganhar, mas sempre na possibilidade de ganhar.
Além disso, os cassinos online e apostas usam um sistema de reforço intermitente, no qual as recompensas (vitórias) ocorrem de forma imprevisível. Isso mantém o jogador sempre esperando o próximo ganho, o que é altamente viciante.
— Ficou com vontade de jogar?
Escrevendo este artigo e imaginando como tudo isso funciona, confesso que, apesar de assustado com a engenhosidade, fiquei com vontade de jogar. Olhe o perigo! Nem ao menos joguei e já comecei a ser envolvido. Não se pode começar.
Voltando, porque há muito mais manipulação. O Dr. Luke Clark, da Universidade da Colúmbia Britânica, esclarece que o córtex pré-frontal, responsável por decisões racionais e controle de impulsos, é prejudicado durante o jogo compulsivo. Sob forte estímulo da dopamina e do desejo de continuar apostando, a capacidade de resistir à tentação diminui, resultando em escolhas impulsivas. Ou seja, não adianta pensar que vai parar, pois seu poder de decisão será alterado.
Semelhante a outras formas de vício, com o tempo, o cérebro começa a desenvolver tolerância à quantidade de dopamina liberada pelas apostas. Isso significa que a pessoa precisa apostar mais ou com maior frequência para obter o mesmo nível de satisfação. A dependência emocional e psicológica faz com que o indivíduo continue apostando para evitar o desconforto e a frustração que vêm com a falta do jogo, mesmo que as perdas financeiras e pessoais se acumulem.
Além da dopamina, muitos cassinos online e apps de apostas utilizam elementos sensoriais (sons, luzes, animações) para reforçar a sensação de vitória ou proximidade dela. Isso ajuda a manter o jogador envolvido e a aumentar o prazer, prolongando o tempo gasto no jogo.
Esses processos criam um ciclo no qual o jogador é levado a apostar compulsivamente, gerando tanto dependência química (ligada à dopamina) quanto emocional, tornando o abandono do hábito extremamente difícil sem intervenção adequada.
— Quando você aposta, você não ganha e o Brasil perde.
Um estudo da consultoria KPMG Strategy&Innovation indica que a indústria de bets no Brasil teve um crescimento expressivo, movimentando entre R$ 60 bilhões e R$ 100 bilhões em 2023. Em 2024, nosso varejo perdeu R$ 103 bilhões. As apostas online podem reduzir em 11,25% a atividade varejista no país.
Uma pesquisa da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) aponta que 46% dos apostadores já renunciaram a algum consumo para poder apostar. A Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) indica que o crescimento do mercado de apostas está impactando principalmente as compras de vestuário e serviços, como restaurantes e viagens. O pagamento de contas também é afetado: 15% dos apostadores já deixaram de quitá-las para usar o dinheiro nas bets.
A pressão para conter o uso do Bolsa Família para pagamento de apostas esportivas cresceu após o Banco Central revelar que beneficiários gastaram cerca de R$ 3 bilhões em transferências via Pix para casas de apostas em agosto. Dos aproximadamente 20 milhões de beneficiários, 5 milhões (25%) fizeram bets. O valor gasto por essa parcela da população pode ser ainda maior, uma vez que o cálculo não levou em consideração o uso de outros métodos de pagamento. No mesmo mês de agosto, o Bolsa Família pagou R$ 14,2 bilhões aos seus beneficiários, com valor médio de R$ 681 por pessoa.
— Se você parar de jogar, vai ganhar muito mais. — Nisso, eu aposto contigo.
Foto: Internet/Reprodução
Comentários (7)
7 respostas para “Bets — A droga digital que destrói famílias e a economia. Por Aragão.”
Excelente artigo ! 👏🏼👏🏼
E um vício q pode levar a outros, como o alcoolismo,
Parabéns pelo aprofundamento do artigo
Obrigado, Flávio.
Parabéns por mais este belíssimo texto e nos remeter a uma reflexão profunda sobre o hábito de jogar.
Obrigado, Ricardo.
Os exemplos estão aí entra quem quer,jogo de apostas armação do diabo
👏👏👏👏👏👏